quarta-feira, 21 de novembro de 2007

O setting sob outra perspectiva

Herrmann (2003) afirma que desde a origem da Psicanálise em Freud, essa é chamada a diferentes lugares, não se restringindo à clínica. Resgata que em Freud a Psicanálise assume uma abrangência significativa na cultura, literatura e nas artes em geral. O autor critica o movimento de restringir o método psicanalítico às clinicas e a determinados setting ritualísticos. Ao trazer o conceito de Clínica Extensa, Herrmann não propõe uma nova terminologia, mas amplia a noção de interpretação para outros contextos além do consultório; dessa forma, o método psicanalítico – a interpretação – ultrapassa a técnica.
O mesmo autor (1977) discorreu a respeito do papel secundário do setting terapêutico e afirmou: "Na clínica psicanalítica, como em tudo na vida, existe o importante e o pouco importante. (...) Na clínica, o importante é a interpretação. O pouco importante é o que se costuma chamar setting, mas prefiro dizer “moldura” (...). Moldura é tudo o que cerca o processo analítico, desde a formação de uma clientela até a montagem do consultório, os horários e rituais, telefone, secretária, divã, poltrona, dar ou não dar a mão na entrada, conversar ou não sobre cinema, sobre dinheiro, sobre o que o paciente deve fazer amanhã. É tudo, menos o que conta, pode-se dizer". (p.33)
Torrecillas e Romera (2006) salientam que todo paciente pode estar em condições de analisibilidade, desde que suas condutas, sentimentos, conflitos e angústias sejam ouvidos, compreendidos e interpretados por ele, junto ao terapeuta, e isso acontece quando o enquadramento, as condições de análise e o vínculo criados pela dupla paciente-terapeuta permitem que o ambiente, fora do setting convencional, seja um aliado do processo terapêutico. Nesse sentido, a resistência à terapia deixa de ser um obstáculo e torna-se material interpretativo, assim como qualquer gesto, sentimento ou fala do paciente o são. E não há como negar que um ambiente muito revelador da psique do paciente é o seu próprio ambiente, que por si só revela e permite que aquele revele sua subjetividade e seus conflitos.
Dessa forma, encontramos um papel secundário do setting, sendo que nos é apontado como de real e crucial importância a interpretação dos fenômenos e da subjetividade do paciente e de suas relações familiares durante o processo terapêutico. Defendemos que a Psicologia se preocupe menos com técnicas e se atenha ao que lhe é prontamente apresentado de fundamental, o método interpretativo, acreditando que o enquadramento se dá pela formação de vínculos e não pela definição rígida de um setting terapêutico.

Autoras: Carolina Moreira Marquez (Integrante do Grupo Mosaico), Nayara Cristina De Faria Cunha, Regiane Sbroion De Carvalho, Universidade Federal de Uberlândia.

Referências:
HERRMANN, F. A Clínica Extensa. In: III Encontro Psicanalítico da Teoria dos Campos (anais). São Pulo: CETEC, 2003. p. 12-22.
HERRMANN, F. Clínica Psicanalítica: A Arte da Interpretação. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1977.
TORRECILLAS, F. G. & ROMERA, M. L. C. A Clínica que nos habita e a que habita em nós: reverso e prosa. Jornal de Psicanálise. São Paulo: SBPSP, vol. 39, n. 71, dez. 2006.

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